sábado, 26 de novembro de 2011

PROVAS VOLUNTÁRIAS. O VERDADEIRO CILÍCIO

      Vós pergutais se é permitido diminuir o rigor das próprias provas. Essa questão faz lembrar estas outras: É permitido àquele que se afoga procurar se salvar? Àquele que se espetou num espinho,retirá-lo? Áquele que está doente, chamar um médico? As provas têm por finalidade exercitar a inteligência tanto quanto a paciência e a resignação; um homem pode nascer numa situação penosa e difícil, exatamente para obrigá-lo a procurar os meios de vencer as dificuldades. O mérito reside em suportar, sem lamentações, as consequências dos males que não se podem evitar, em perseverar na luta, em não se deseperar se não for bem sucedido, mas não com negliência que mais seria preguiça do que virtude.
     Essa questão naturalmente nos leva a uma outra. Uma vez que Jesus disse: "Bem aventurados os aflitos", há mérito em procurar as aflições agravando suas provas com sofrimentos voluntários? A isso responderei muito claramente:sim, há um grande mérito quando os sofrimentos e as privações têm por objetivo o bem do próximo, pois trata-se da caridade pelo sacrifício; não quando têm por finalidade apenas o próprio bem, porque é egoísmo por fanatismo.
    Aqui há uma grande distinção a fazer, para vós,pessoalmente: contentai-vos com as provas que Deus vos envia, não aumenteis a sua carga, às vezes já tão pesada; aceitai-as sem lamentações e com fé,é tudo o que ele vos pede. Não debiliteis o vosso corpo com privações inúteis e mortificações sem objetivo, porque tendes necessidade de todas as vossas forças para realizar a vossa missão de trabalho na terra. Torturar e martirizar voluntariamente vosso corpo é transgredir a lei de Deus, que vos dá os meios de  sustentá-lo e fortificá-lo;enfraquecê-lo sem necessidade, é um verdadeiro suicídio. Usai, mas não abuseis: essa é a lei;o abuso das melhores coisas acarreta punição por suas consequências inevitáveis.
   Bem diferente é o que acontece quando alguém se impõe sofrimentos para o benefício do seu próximo. Se suportais o frio e a fome para aquecer e alimentar aquele que precise, e se o vosso corpo padece por isso, eis o sacrifício que é abençoado por Deus. Vós que deixais vossos aposentos perfumados para ir a um casebre miserável levar consolação;vós que sujais as vossas mãos delicadas,tratando de chagas;vós que deixais de dormir para ficar junto a um doente que apenas é vosso irmão diante de Deus; vós,enfim, que usais vossa saúde na prática das boas obras,esse é o vosso sacrifício, verdadeiro cilício abençoado, porquanto as alegrias do mundo não ressecam o vosso coração; não vos deixastes levar pelos prazeres ilusórios da fortuna, mas vos transformastes em anjos consoladores dos pobres desvalidos.
         Mas vós que vos retirais do mundo para evitar as suas seduções e viver no isolamento, qual a vossa utilidade na Terra? Já que fugis da luta e abandonastes o combate, onde está a vossa coragem diante das provas? Se desejais um cilício,aplicai-o em vossa alma e não em vosso corpo; mortificai o vosso espírito e não a vossa carne; castigai o vosso orgulho; recebei as humilhações sem vos lastimardes, esmagai vosso amor-próprio; tornai-vos insensíveis contra a dor da injúria e da calúnia, mais pungente que a dor corporal. Eis o verdadeiro cilício cujas feridas vos serão contadas, porque elas serão a prova da vossa coragem eda vossa submissão á vontade de Deus. (Um anjos guardião. Paris, 1893)


(ESE - Alan Kardec, V Bem Aventurados os Aflitos ,Itém 26 )

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